segunda-feira, 13 de abril de 2009

NOTICIAS JURÍDICAS

Pacto prevê proteção a juízes contra quadrilhas
Documento será assinado hoje por Lula, Gilmar Mendes, Sarney e Temer
Felipe Recondo
Uma proposta incluída no chamado pacto republicano, que será assinado hoje pelos presidentes dos três Poderes, em Brasília, vai proteger juízes de primeiro grau que julgam integrantes de organizações criminosas. Em vez de julgarem sozinhos as lideranças de facções criminosas, os magistrados poderão compor um colegiado específico para esses casos. O pacto republicano foi antecipado pelo Estado na sexta-feira.

A finalidade é evitar riscos para os juízes e, ao mesmo tempo, proteger os julgamentos de possíveis pressões. A sugestão foi incorporada ao pacto por representantes do Judiciário e, conforme o documento, tem por objetivo "trazer garantias adicionais aos magistrados, em razão da periculosidade das organizações e de seus membros".

Casos como os dos juízes Odilon de Oliveira, ameaçado de morte por traficantes de Mato Grosso do Sul, e Julier Sebastião da Silva, que precisou da proteção da Polícia Federal após condenar o líder de uma das maiores quadrilhas de Mato Grosso, mostram o risco que os magistrados correm ao julgar o crime organizado.

Segundo integrantes do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), magistrados dizem temer atentados quando têm sobre a mesa processos que envolvam líderes de facções criminosas. O mesmo receio já foi relatado por um ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) quando teve de julgar habeas corpus de líderes do Primeiro Comando da Capital (PCC).

Com essa possibilidade de os juízes se protegerem, o julgamento na primeira instância se assemelharia ao da segunda instância, onde é um colegiado quem decide o futuro do réu.

Apesar de a novidade ser pactuada pelos presidentes do Executivo, Luiz Inácio Lula da Silva, do Judiciário, Gilmar Mendes, e do Legislativo, José Sarney (PMDB-AP) e Michel Temer (PMDB-SP), integrantes do governo argumentam que nada impede que uma facção ameace todos os juízes que componham esse colegiado.

Para proteger os acusados de crimes, o pacto republicano proporá atualizar a legislação que trata do abuso de autoridade. A meta é acabar com uma prática corriqueira nas delegacias de polícia: as entrevistas coletivas em que presos são fotografados e filmados, especialmente quando se trata de líderes de quadrilhas ou envolvidos em casos que ganharam repercussão. O texto, ainda em estudo no Ministério da Justiça, vai enquadrar essa prática como abuso de autoridade. E o responsável poderá ser punido com reclusão de 6 meses a 2 anos. O projeto deve ser encaminhado ao Congresso nos próximos meses.

A falta de punição para quem expõe presos é atacada por Gilmar Mendes. "A exposição do preso viola a ideia da presunção de inocência", disse ele recentemente.

(PUBLICADO no Estadão do dia 13.04.09)

O STF e os remédios do SUS
Depois de avocar a responsabilidade de definir o destino da enxurrada de liminares que têm sido concedidas pelas instâncias inferiores da magistratura contra Estados e municípios, obrigando-os a fornecer, gratuitamente, remédios de alto custo que não constam das listas do Sistema Único de Saúde (SUS), o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu promover audiência pública para ouvir os setores interessados, antes de julgar a questão. A audiência foi marcada para a última semana de abril e os debates, que serão transmitidos ao vivo pela TV Justiça, servirão para orientar o julgamento.

Nem mesmo a mais alta Corte do País sabe, ao certo, quantas ações foram ajuizadas contra as autoridades da área de saúde em todo o País. Mas todas elas têm o apoio do Ministério Público e se baseiam no artigo 196 da Constituição, cujo texto é claro. Ele define a saúde como "direito de todos e dever do Estado" e atribui ao poder público a obrigação de garantir esse direito "mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação".

Com base nesse artigo, os autores das ações pedem à Justiça que obrigue os municípios, os Estados e a União a prestar serviços não previstos pelas políticas públicas existentes e a assegurar aos pacientes o fornecimento regular e gratuito de medicamentos de última geração e de suplementos alimentares recém-aparecidos no mercado. Também se pede aos tribunais o fornecimento de próteses, a realização de cirurgias e até tratamentos médicos no exterior.

Para as autoridades da saúde, vários desses pedidos não se justificam, do ponto de vista clínico, e a maioria dos novos medicamentos exigidos judicialmente custa muito mais do que aqueles que já estão incluídos na lista de distribuição do SUS. Em outras palavras, os medicamentos similares seriam mais baratos e teriam efeito terapêutico semelhante ao dos novos remédios. Além disso, muitos desses remédios são comercializados apenas no exterior, não tendo sido ainda devidamente registrados no Brasil por seus fabricantes. Assim, alegam as autoridades da saúde, os milhares de liminares que as obrigam a fornecer indiscriminadamente medicamentos novos e caros, sob pena de bloqueio de verbas públicas, estariam desorganizando o planejamento e as finanças dos Estados e municípios.

Só em São Paulo, onde tramitam mais de 25 mil ações desse tipo, desde 2002, a Secretaria da Saúde gasta R$ 25 milhões por mês para cumprir ordens judiciais de distribuição de medicamentos que não constam da lista do SUS. No Rio Grande do Sul, onde foram impetradas cerca de 4,5 mil ações somente no primeiro semestre de 2008, o gasto é de R$ 6,5 milhões mensais.

Já se sabe que na audiência pública marcada para o final do mês pelo STF, os secretários estaduais de Saúde e os procuradores de Justiça dos Estados deverão voltar à tese da "judicialização da saúde" e criticar o excesso de "ativismo" de promotores de Justiça e defensores públicos. No Estado do Rio de Janeiro, 90% das ações que reivindicam remédios e tratamentos específicos que não constam da lista do SUS foram impetradas pela Defensoria Pública, órgão que dá assistência jurídica à população carente. Com o apoio de ONGs e entidades defensoras de direitos humanos, o Ministério Público e as Defensorias Públicas deverão, por seu lado, repetir o que têm dito - ou seja, que a medicina evolui, que as listas de medicamentos do SUS estão defasadas e que o artigo 196 da Constituição tem sido sistematicamente desrespeitado pelas autoridades da saúde.

O que permitiu ao STF avocar para si o julgamento da questão no mérito e vincular a decisão que adotar a todos os processos abertos contra as autoridades da saúde é o princípio da repercussão geral. Trata-se de um mecanismo processual criado pela reforma do Judiciário, em 2004, para agilizar o julgamento das chamadas "ações de massa". Graças a ele, ações que interessam a contingentes expressivos da população e são importantes para o equilíbrio das finanças públicas podem tramitar mais rapidamente.
Opinião no Estadão – publicado dia 13.04.09

Nenhum comentário: